domingo, 5 de dezembro de 2010

A Janela de Sarah

Peter era um menino comum, como qualquer outro. Tirava notas medianas na escola, não arrumava problemas, jogava futebol americano com seus amigos. Tinha 16 anos e morava com os pais, Jean e Marc Johnson, seus irmãos mais novos Claire e Jason e seu cachorro Scotty. Tudo na vida de Peter era muito normal. Até o dia em que conheceu Sarah.
Sarah era uma menina bonita, da idade de Peter, que se mudou para a vizinhança a alguns meses. O menino a viu pela primeira vez da janela de seu quarto, pálida, comos cabelos escuros e os olhos negros e muito penetrantes, algo que impressionou bastante o garoto. Decidiu puxar assunto, escreveu em um pedaço de papel e mostrou pelo vidro "olá, tudo bem? qual seu nome?" e assim começaram a conversar.
Ficaram amigos e sempre se viam pelas janelas. Sarah estava sempre desanimada e sombria, mas Peter não se importava, se apaixonara pela menina. Convidou-a para sair, ir a lanchonetes, a festas, ao cinema... mas a menina nunca aceitou. Sempre dizia que os pais eram muito restritos e não a deixavam sair. Ofereceu para ir visitá-la, já que queria vê-la e esse seria o único jeito para se verem. A menina ficou nervosa, disse que não seria uma boa ideia e saiu correndo da frente da janela.
Peter ficou desapontado e chateado mas depois começou a desconfiar. Que tipo de pais não deixariam a menina sair de casa nunca? Organizando os pensamentos, nunca tinha visto a menina sair de casa, nem com os pais nem com os irmãos mais novos. Não podia ligar para Sarah porque não tinha seu telefone, nem email, nem nenhuma forma de contatá-la. Achou estranho e muito suspeito.
Passou a ficar obcecado pela garota e pela situação. Suas notas na escola começaram a cair, fora expulso do time de futebol pelas faltas nos treinos. Começou a passar muitas horas do dia olhando pela janela de seu quarto, ora conversando com Sarah ora seguindo todos os passos de quem morava na casa. Percebeu que Sarah nunca saia de casa e chegou a uma conclusão: os pais da menina a trancavam em casa e a mantinham em cativeiro.
Resolveu então, arquitetar um plano para invadir a casa vizinha. Em uma sexta-feira que todos da casa sairam - menos Sarah, lógico - ele se preparou para resgatar a amiga e ir direto para a polícia. Assim que arrombou a porta e entrou na casa, sentiu um arrepio na espinha. Tudo era normal visualmente, era uma casa como qualquer outra porém emanava uma sensação muito sombria e desesperadora.
Sentindo um medo inexplicável, Peter seguiu em frente com seu plano de resgate. Tinha calculado e sabia ao certo onde era o quarto de Sarah. Subiu as escadas que rangiam a cada passo que dava. A luz amarela da lanterna era fraca e dava a tudo um ar muito mais horripilante do que realmente poderia ser. Chegou ao local que procurava. Escutou sua respiração forte, enquanto abria aporta do quarto de Sarah.
Entrou no quarto escuro e percebeu que não era como via pela janela de seu quarto. Era um tipo de escritório, com as paredes cheias de livros, uma grande mesa no centro e duas poltronas dispostas ao lado com uma grande luminária no meio. Gritou por Sarah e não foi respondido. Saiu correndo, entrando em todos os cômodos da casa, buscando pela menina.
Quando a procurava na sala, a porta principal de abriu e a família que alí morava entrou e se espantou assim que perceberam Peter e que sua casa havia sido arrombada. Fora de si, o garoto pulou no pai, agarrando seu pescoço e perguntando o que haviam feito com sua amiga, onde estava Sarah. A mulher tentou separar Peter do marido, enquanto as crianças gritavam, mas nada adiantava. Pegou um abajur e bateu com ele na cabeça do invasor.
Peter acordou no hospital, com a cabeça enfaixada e muito dolorida. No quarto estavam seus pais e, reconheceu após alguns segundos, os pais de sua amiga. Ao lhe perguntarem o porquê de terem invadido a casa vizinha, o garoto explicou tudo, desde sua amizade a distância até a disconfiância que tinha dos pais da menina.
A família Carter, os vizinhos, espantados explicaram que não tinham uma filha de 16 anos, apenas as duas crianças. Peter não conseguia acreditar. Descreveu a menina e falou de todas as conversas que tiveram... Os Carter ouviram tudo pacientemente até ouvir o nome: Sarah. A mulher ficou branca e começou a chorar, abraçada ao marido.
Quando se acalmou, explicou que, quando era jovem, sua irmã gêmea havia entrado em uma depressão muito forte por causa do bullying que sofria na escola. Sarah, a irmã gêmea da Sr. Carter, se envolveu com magia negra para poder se vingar dos colegar. Matando três e depois de matando. Foi um episódio bastante traumático para a família.
Peter não conseguia entender o que lhe diziam. A menina que tanto gostava estava morta havia 15 anos? Isso não podia existir. A família Carter não prestou queixa contra o garoto e decidiu se mudar. Peter voltou para casa e subiu em seu quarto.
Olhou pela janela. Na casa ao lado viu Sarah, como sempre a viu. A menina o olhou nos olhos intensamente e levantou a mão. Estava segurando uma enorme faca de cozinha. Deu um sorriso malígno e, ainda olhando Peter nos olhos, enfiou a faca que segurava em seu peito, perfurando o coração.
Apavorado, Peter tentou colocar as mão na janela mas percebeu que não podia. Sua camisa começou a ficar molhada e dela pintou no chão gotas de sangue. Segurava o cabo de uma faca próxima ao peito. Levantou os olhos para a janela e viu sua amiga Sarah lhe dar um tchau e desaparecer na escuridão de seu quarto.
Peter caiu, com a respiração ficando cada vez mais lenta, os olhos pesados, até que tudo apagou.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Brighter than the Moon

Ele estava andando pra casa. A volta era sempre a mais difícil, até porque já estava cansado do dia exaustivo que teve na faculdade. Sempre teve medo de morar sozinho, saiu de casa, no interior de Minas Gerais, direto pra um apartamento dividido com um colega de curso.
Suspirou ao lembrar do roomate. Não poderia entrar em casa porque o amigo estaria acompanhado, de acordo com a mensagem recebida na última aula que teve, chata por sinal. Poxa, era sexta-feira, 18h10, o que mais queria era chegar em casa, tomar um bom banho quente, colocar seu pijama de flanela estampado com o personagem Stewie Griffin de Family Guy, botar Harry Potter no dvd e assistir a noite toda tomando coca-cola zero.
Pensou em ligar pra Rafael. Fazia dias que não se viam e ele sentia uma saudade muito grande de sua companhia e de seu beijo. Talvez, quem sabe, não passasse aquela noite assistindo filme sozinho. Talvez pudesse aproveitar aquela sexta.
Mas não. Melhor não. Rafael fora muito estranho na última vez que se falaram pelo msn. Vai ver é por isso que eles não se falaram direito, Rafael deve estar de saco cheio dele. Baixou a cabeça pra calçada e aumentou o volume da música que estava escutando no fone de ouvido. Se achou gordo, feio e chato. Só podia ser isso. Vai ver o papo chato de nerd que tinha deve ter assustado Rafael.
Continuou andando e pensando o quanto ele devia ser insuportável e horroroso. Era baixinho, e gordinho e não conseguia falar direito com as pessoas que se interessava com medo de levar fora. Prometeu a si mesmo que entraria na academia no dia seguinte, pararia de fumar e de beber refrigerante. Álcool não, não tinha como.
A música que escutava acabou e "This is the night" começou, música do filme de Harry Potter. Deu uma risada e sacodiu a cabeça. Como ele pode ser tão criança, tão infantil? Ia chegar em casa e estudar. Assim que seu colega terminasse o que estivesse fazendo com a companhia, claro.
Continuou caminhando, arrumando a mochila que não parava de escorregar no ombro. Pensou de novo no dia, sexta-feira, e no desperdício que seria se ficasse em casa estudando ou assistindo filme. Afinal, é pra isso que serve o domingo. Pegou o celular de novo e mandou uma mensagem pra sua amiga Patrícia: "barzinho hoje, jaé?"
Um tempo depois recebeu a resposta: "Jaé! Te encontro no bar 20h. bjo". Teria, pelo menos, um bom tempo pra tomar banho e entrar na internet pra ver os emails. Quem sabe Rafael não tenha mandado um scrap, email, tweet ou o que quer que seja, chamando pra sair.
E teria que ligar pra mãe pra pedir mais dinheiro, que o dele já estava acabando. Lembrou da festa que fora no sábado passado. Pagou caro pra entrar e beber e nem foi tão boa assim, Rafael tinha viajado...
Ficou irritado consigo mesmo. Não podia acreditar no quanto era dependente das pessoas. Queria mesmo era namorar, mas por favor! Não precisava ser dependente de alguém desse jeito. Tinha muitos amigos, pessoas que ele gostava e que gostavam dele. Rafael era só mais um que o fazia feliz. Só mais um. Em pouco tempo estaria se auto-sabotando de novo.
Percebeu que estava desligado das coisas quando esbarrou em uma senhora que saia do mercado. Pediu desculpas e ajeitou os óculos. Deu mais alguns passos e já estava no seu prédio. Procurou as chaves no bolso. Não achou. tentou no bolso menor da mochila. Entre papéis de balas e chicletes, canetas sem tintas e camisinhas ganhadas dos amigos em seu aniversário de 18 anos, achou o chaveiro que ganhou de uma farmácia e abriu a porta.
Seu Geraldo, o porteiro, estava dormindo. Virou pro lado e se olhou no espelho. Sorriu, fez careta, ficou sério e se olhou intensamente. Uma pessoa que estivesse a metros de distância conseguiria ver aquelas olheiras enormes que tinha atrás dos óculos. O rosto era muito redondo, cara de bolacha.
Revirou os olhos e seguiu em frente. Subiu as escadas até o terceiro andar e encontrou o companheiro de quarto na porta com uma garota. Se beijavam, aparentemente se despedindo. Se espremeu entre os dois e entrou. Largou a mochila no chão e se jogou na cama. Olhou para o teto pensando no tanto de coisa que tinha pra fazer e na pouca disposição que sentia.
Olhou pros lados, viu seu pôster de Harry Potter; mandou um beijo pro Rony. Olhou pro quadro de fotos e achou uma foto com seus pais e seus irmãos e sua garganta ardeu. Sentia falta da família, sentia falta de alguém pra ficar junto.
O colega com quem morava era divertido e uma pessoa legal, mas seu relacionamento era meio restrito. Pensou que devia ser por isso a necessidade de estar num namoro, por isso que pensava em Rafael o tempo todo. Tentava muito, mas em vão.
Ligou o computador e encontrou uma mensagem de Rafael. Dizia que teve que viajar e que voltou com saudades, que queria o ver hoje. Ligou pra ele e disse pra onde iria; marcaram de se encontrar no bar.
Ficou feliz e entrou no Twitter: "Quem curte barzinho hoje?" Botou Firework da Katy Perry pra tocar bem alto, pegou sua toalha e foi ao banheiro tomar banho. Estava no chuveiro quando escutou o colega gritando, reclamando do barulho.
Deu uma risadinha e continuou a cantar.

Boom, boom, boom... Even brighter than the Moon, Moon, Moon...